Cafeína Faz Mal ou Faz Bem Afinal?
Categorias: Emagrecimento / Suplementos
Você certamente já viu que cafeína faz mal ou faz bem em inúmeras revistas e sites especializados em saúde, além de ouvir em conversas com amigos e médicos por aí. E se por acaso ainda está em dúvida sobre os verdadeiros efeitos da cafeína, saiba que não está sozinho.
A substância estimulante encontrada no café, chocolate, guaraná e até mesmo em refrigerantes é de fato bastante controversa. E não é de agora.
Quatro séculos atrás, o café já foi considerado uma cura milagrosa para o alcoolismo. Pouco tempo depois, passou-se a acreditar que a bebida causava impotência. Por volta de 1750, o café era a bebida da moda, sobretudo porque achava-se que os trabalhadores eram mais eficientes sob o efeito da cafeína.
Avançaram-se 100 anos e o café passou a ser considerado uma droga comparável à cocaína e morfina, e que poderia até mesmo causar cegueira. Você já percebeu onde isso vai chegar, certo?
Nas últimas décadas, o que tivemos foi exatamente isso: uma sucessão de informações até certo ponto contraditórias, que ora exaltavam os benefícios da cafeína e depois passavam a considerar o composto um grande inimigo da saúde.
Mas isso foi no passado. E hoje, em que ponto estaríamos? Afinal, a cafeína faz mal ou faz bem? O que dizem os últimos estudos sobre o contraditório assunto? Vamos conferir logo abaixo.
Saiba mais
A cafeína é um composto químico que pode ser classificado como um alcaloide, sendo naturalmente encontrado nas folhas e sementes de muitas plantas. A substância também pode ser produzida artificialmente e adicionada a determinados alimentos, como suplementos e bebidas energéticas.
Além do café, o cacau, chá preto e guaraná são as fontes naturais de cafeína mais conhecidas dos brasileiros. Mais recentemente, com o surgimento da onda fitness, inúmeros suplementos para atletas passaram a contar com cafeína entre seus principais ingredientes.
Este é o caso dos suplementos termogênicos para queimar gordura que, como o próprio nome já diz, prometem facilitar a sempre difícil tarefa de reduzir medidas.
Para que serve
Considerada a droga estimulante legal mais consumida em todo o mundo, a cafeína tem ação psicotrópica, ou seja, ela altera o funcionamento do sistema nervoso. A substância age também sobre o metabolismo basal, e estimula a secreção de ácido gástrico.
De maneira resumida, podemos dizer que a cafeína aumenta o foco e a concentração, favorecendo o aprendizado e a execução de tarefas que exijam grande esforço mental.
Para quem pratica atividade física ou está tentando emagrecer, a cafeína serve para reduzir a percepção de cansaço e aumentar o gasto energético do organismo.
Mecanismo de ação da cafeína
Molecularmente, a cafeína é semelhante à adenosina, um nucleosídeo que está presente em todas as células do corpo humano.
A adenosina se combina com fosfato para formar diversos compostos químicos, incluindo aí a adenosina monofosfato (AMP) e o trifosfato de adenosina – ou ATP, a molécula armazenadora de energia nos seres vivos.
No cérebro, a adenosina funciona como um neurotransmissor inibidor, o que significa que a substância age como um depressor do sistema nervoso central.
Em condições normais (ou seja, na ausência de cafeína), a adenosina controla o sono e inibe o despertar através de uma redução no estímulo aos neurônios. Ao se ligar a receptores específicos no cérebro, a adenosina também promove uma dilatação dos vasos sanguíneos cerebrais, a fim de aumentar a captação de oxigênio durante o sono.
Quando estamos acordados, os níveis de adenosina no cérebro aumentam gradualmente com o passar das horas, o que acaba por reduzir o nível de alerta e eventualmente induz ao sono.
Agora vamos ao que acontece quando consumimos cafeína:
- Cerca de 45 minutos após a ingestão, a substância é totalmente absorvida na circulação e nos tecidos (o pico da concentração plasmática da droga é atingido 20-25 minutos após o consumo);
- Nossos neurônios “enxergam” a cafeína exatamente como uma molécula de adenosina. Assim, a cafeína pode se ligar aos receptores de adenosina. Como todos os receptores são ocupados pela cafeína, as células já não podem mais ser estimuladas pela adenosina;
- Como resultado, há um aumento da atividade celular, uma vez que a cafeína tem efeito oposto ao da adenosina;
- A cafeína bloqueia a ação vasodilatadora da adenosina, o que acarreta na constrição das veias e artérias cerebrais;
- Com o bloqueio da adenosina, há um aumento quase que instantâneo da atividade neuronal. A hipófise entende essa atividade fora do normal como uma emergência, e acaba por liberar hormônios que sinalizam para as glândulas suprarrenais que é necessário secretar adrenalina;
- Evolutivamente, a adrenalina (ou epinefrina) é tida como nosso hormônio de “luta ou fuga”, ou seja, sua função milhares de anos atrás era preparar o corpo para tentar sobreviver ao ataque de predadores;
- Para que estivéssemos aptos a lutar com um leão ou sair correndo, a descarga de adrenalina resultava em uma série de efeitos que também podem ser observados após o consumo da cafeína.
São eles:
- dilatação das pupilas;
- aceleração dos batimentos cardíacos;
- contração dos vasos sanguíneos (efeito que resulta no aumento da pressão arterial);
- redução do fluxo de sangue para o estômago;
- aumento da força de contração muscular;
- liberação de açúcar do fígado para a circulação (a fim de aumentar a oferta de energia para as células).
Todos esses efeitos da cafeína são de curta duração, pois em poucas horas a cafeína é removida do organismo através da urina. Por esse motivo, muitas pessoas acabam aumentando gradualmente a ingestão da droga, a fim de não interromper seus efeitos estimulantes (o que faz com que desenvolvam tolerância à cafeína).
A cafeína faz mal ou faz bem?
Para responder a essa controversa questão, é necessário avaliar o que já sabemos sobre os principais benefícios e efeitos colaterais da cafeína.
Vamos começar com os prós:
– A cafeína melhora o desempenho cerebral
De fato, como vimos acima, a cafeína aumenta a concentração, reduz o tempo de reação e melhora a função cognitiva como um todo.
Segundo um estudo publicado em 2014 no Journal of Nutrition, voluntários que haviam consumido uma dose maior de cafeína apresentaram melhores resultados em testes para avaliar a função cerebral.
Outras pesquisas sugerem ainda que a cafeína melhora o humor, favorece a memória de longo prazo e aumenta a capacidade de organização do pensamento.
– Evita a Depressão
Pessoas que consomem cafeína apresentam menor risco para depressão e suicídio. Em um estudo da Universidade de Harvard, pesquisadores constataram que pessoas que tomavam mais café apresentavam um risco 20% menor de se tornarem depressivas.
Uma revisão científica de três estudos concluiu que pessoas que bebiam quatro ou mais xícaras de café ao dia tinham uma probabilidade 53% menor de cometer suicídio.
– Reduz o risco de doenças neurodegenerativas
Pessoas que bebem muito café têm um risco oito vezes menor de desenvolver o mal de Parkinson, de acordo com o National Institute of Neurological Disorders and Stroke dos Estados Unidos.
Segundo o Dr. Rob van Dam, professor de Harvard, essa efeito se deve muito provavelmente à ação da cafeína, e não dos nutrientes do café.
Pesquisas recentes indicam ainda que o consumo de café reduz em 65% o risco de Alzheimer, a principal causa da demência associada à idade.
– Previne determinados tipos de câncer
Um estudo publicado em 2012 no American Journal of Epidemiology concluiu que pessoas que tomavam quatro xícaras ou mais de café por dia apresentavam metade do risco de morte por câncer de boca de quem nunca ou apenas eventualmente consumia a bebida.
Outros tipos de câncer que poderiam ser prevenidos com o consumo de café (de acordo com pesquisas científicas): fígado, útero, cólon e próstata.
– Melhora o desempenho esportivo
Uma série de estudos tem demonstrado que a cafeína faz bem à performance atlética. Além de reduzir a percepção do esforço, a substância também aumenta a mobilização dos estoques de ácidos graxos, efeito que poupa as reservas de glicogênio e ajuda a prolongar o exercício.
Outros benefícios da cafeína para quem treina: melhora na eficiência metabólica do mecanismo energético durante a atividade, regulação da atividade da bomba Na+ K+ e aumento da força muscular.
– Menor risco de desenvolver diabetes tipo 2
Uma revisão de 18 estudos envolvendo 457.922 pessoas mostrou que uma xícara diária de café é capaz de reduzir em até 7% o risco de diabetes tipo 2.
Outras pesquisas encontraram resultados semelhantes, tendo algumas delas demonstrado uma redução de até 67% no risco de diabetes para quem consome café regularmente.
Esses dados podem ser explicados pela ação da cafeína sobre a insulina, o hormônio que regula a entrada de glicose nas células. Segundo uma pesquisa publicada no Diabetes Care, uma maior ingestão de café se correlaciona positivamente com o aumento da sensibilidade à insulina.
– Aumenta a expectativa de vida
Alguns estudos indicam que pessoas que têm o hábito de tomar café regularmente vivem mais. A afirmação faz sentido quando se leva em consideração que apreciadores de café apresentam menos doenças, como acabamos de ver acima.
Um amplo estudo publicado em 2012 no New England Journal of Medicine analisou os hábitos de 402.260 pessoas entre 50 e 71 anos de idade, e concluiu que aquelas que bebiam mais café (4-5 xícaras ao dia) apresentavam um risco de morte consideravelmente menor durante a duração da pesquisa (12-13 anos).
Embora o efeito acima possa ser atribuído em parte aos antioxidantes do café, é possível que os mesmos benefícios possam ser obtidos com um consumo moderado de cafeína.
– Outros benefícios
Há evidência científica de que o consumo de cafeína reduz a ocorrência de infarto em mulheres e também melhora as funções do fígado, prevenindo a cirrose e outras complicações hepáticas.
Agora, o lado contrário: por que a cafeína faz mal?
– Afeta o sono
Se por um lado a cafeína é benéfica para quem precisa ficar acordado e alerta, por outro ela também atrapalha o sono. Quem toma uma xícara de café às 8 da manhã ainda terá no organismo 25% da cafeína ingerida mesmo 12 horas mais tarde.
Já quem toma café na hora do almoço ou no meio da tarde terá nada menos que 50% da cafeína em seu corpo na hora de dormir. Os efeitos que nos levam a crer que tomar cafeína faz mal ao se deitar já são bastante conhecidos: agitação, dificuldade para relaxar e falta de sono.
– Causa irritação
Quem já tomou suplementos com alto teor de cafeína sabe que a as alterações de humor, a irritação e o nervosismo são uma constante durante o uso do produto.
Exagerar na dose de cafeína também pode causar agressividade, taquicardia, sudorese, tremores e até mesmo ataques de pânico.
– Aumenta o risco de osteoporose
A cafeína acentua a perda de cálcio através da urina, aumentando o risco de fraturas ósseas e favorecendo o surgimento da osteoporose.
De acordo com a Dra. Linda Massey, professora da Washington State University, mulheres na pós-menopausa que consomem mais de 300 mg diárias de cafeína mas que não ingerem uma concentração adequada de cálcio podem sofrer com perda de massa óssea da coluna vertebral.
Para evitar esse problema, a pesquisadora recomenda reduzir o consumo de cafeína e garantir uma ingestão de pelo menos 800mg de cálcio por dia.
– Pode causar incontinência
Um estudo da Universidade do Alabama, nos Estados Unidos, sugere que mulheres que consomem muita cafeína (mais de 329 mg ao dia, segundo dados da pesquisa) apresentam um risco até 70% maior de desenvolver incontinência urinária.
– Causa tolerância
Apesar da cafeína demorar algumas horas para sair do organismo, seus efeitos positivos sobre o sistema nervoso podem durar pouco tempo. Assim, quem consome a substância para ficar mais alerta pode acabar precisando de outra dose em pouco tempo.
O que ocorre é que a pessoa se torna tolerante à cafeína, e precisa de concentrações cada vez maiores – e frequentes – da substância para sentir seus efeitos.
Isso pode ser revertido com a redução no consumo da cafeína, embora isso possa causar efeitos colaterais como dores de cabeça, cansaço, confusão mental e irritabilidade. E nunca é demais lembrar que tolerância e abstinência são sinais de dependência física.
– Pode provocar overdose
A cafeína pura é um poderoso estimulante, e mesmo em pequena quantidade pode causar uma overdose acidental – é o que diz a FDA, a agência norte-americana reguladora de alimentos e medicamentos dos Estados Unidos.
Para a Mayo Clinic, também dos Estados Unidos, o consumo de até 400 mg de cafeína diariamente parece ser seguro para a saúde. Essa concentração é equivalente a quatro xícaras de café, ou 10 latas de refrigerante. Ou ainda, a dois energéticos.
Já uma concentração diária acima de 500-600 mg da substância eleva o risco de overdose.
– Outros efeitos colaterais da cafeína
A cafeína faz mal também porque pode elevar a concentração de glicose na circulação e em quantidades muito elevadas aumenta o risco de problemas cardíacos em pessoas com histórico de doenças cardiovasculares.
O consumo de uma quantidade excessiva de cafeína também pode causar:
- azia, queimação e dores de estômago;
- aumento do risco de câncer no trato urinário;
- diurese;
- náusea.
Veredicto: a cafeína faz mal ou não, afinal?
Analisando os principais estudos científicos e amplas revisões sobre o assunto citadas acima, podemos deduzir que o consumo de cafeína está relacionado a diversos benefícios à saúde, mas também pode causar efeitos colaterais. Assim como outras drogas, o segredo parece estar na dosagem.
Ou seja: em quantidades moderadas, a cafeína não traz riscos à saúde, e pode ser consumida sem maiores preocupações. O problema está no consumo de doses mais elevadas, que podem de fato trazer algumas complicações.
O que seriam concentrações elevadas?
Muito embora a Mayo Clinic fale em valores acima de 400 mg ao dia, a quantidade exata pode ficar abaixo disso para algumas pessoas. Isso porque há quem tenha menor tolerância aos efeitos da cafeína, e acabe por sentir efeitos – positivos e negativos – com uma concentração muito menor da substância.
Algumas pessoas podem beber 6 xícaras de café por dia e não apresentar nenhum tipo de reação à cafeína. Outras não podem tomar a bebida após o meio dia sob o risco de perder completamente o sono à noite.
Portanto, irá depender de você e da tolerância do seu organismo à substância.
É importante notar também que boa parte dos estudos analisando os efeitos da cafeína e do café são observacionais, mas que não provam que foram os dois os causadores dos efeitos benéficos.
Mas, de maneira geral, parece seguro afirmar que, em doses moderadas, não é verdade que a cafeína faz mal à saúde. Essa é também a opinião do Dr. Rob van Dam, que como já vimos é uma autoridade mundial no assunto.
Para o pesquisador, o café é uma bebida saudável e quase sem calorias, o que o torna uma boa opção para quem está preocupado com o peso.
Mas fica a recomendação: se você tem pressão alta, dificuldade para dormir, ou então sofre com transtorno de ansiedade, convém limitar a ingestão de cafeína.
Referências adicionais:
- Jonathan L. Gleason, M.D.,et al. CAFFEINE AND URINARY INCONTINENCE IN US WOMEN. Int Urogynecol J. 2013 Feb; 24(2): 295–302.
- Rob M. van Dam, PHD, Wilrike J. Pasman, PHD and Petra Verhoef, PHD. Effects of Coffee Consumption on Fasting Blood Glucose and Insulin Concentrations. Randomized controlled trials in healthy volunteers. Diabetes Care December 2004 vol. 27 no. 12 2990-2992.
- http://hub.jhu.edu/2014/01/12/caffeine-enhances-memory
- http://www.hsph.harvard.edu/news/press-releases/moderate-coffee-drinking-may-lower-risk-of-premature-death/
- https://www.uhs.umich.edu/caffeine
- https://www.rochester.edu/uhs/healthtopics/nutrition/files/Caffeine.pdf
- http://umm.edu/health/medical/ency/articles/caffeine-in-the-diet
- https://www.rush.edu/health-wellness/discover-health/health-benefits-coffee
- http://www.aarp.org/health/healthy-living/info-10-2013/coffee-for-health.html
- http://www.webmd.com/balance/caffeine-myths-and-facts?page=2